Gestão estratégica no direito: inteligência de dados como ferramenta contra litígios abusivos
por CCHDCEmpresas que adotam inteligência de dados no contencioso trabalhista não apenas reduzem riscos, mas também lideram um novo modelo de prevenção contra práticas abusivas no setor jurídico.
O ambiente corporativo contemporâneo enfrenta desafios cada vez mais complexos, especialmente no campo do contencioso trabalhista. Com a crescente facilidade para peticionar, impulsionada por tecnologias como inteligência artificial e outras ferramentas modernas, o peticionamento irresponsável tornou-se uma preocupação significativa.
Além do peticionamento irresponsável, a advocacia abusiva moderna enfrenta outros problemas que comprometem a eficiência e a ética no campo jurídico. Um dos principais desafios é a banalização de ações judiciais, muitas vezes movidas sem fundamento sólido, apenas para sobrecarregar o judiciário ou forçar acordos financeiros.
Outro problema está relacionado à utilização inadequada de tecnologias, como a automação de processos e ferramentas de IA, que, se mal aplicadas, podem gerar petições genéricas e sem a devida personalização ou análise crítica do caso concreto. Além disso, a busca excessiva por ganhos financeiros, em detrimento da ética e do compromisso com os direitos dos clientes, tem fomentado práticas como a litigância de má-fé e a instrumentalização dos litígios como estratégia de pressão.
A competitividade no mercado jurídico também tem levado a uma abordagem predatória, com captação de clientela de forma antiética e exploração de situações de vulnerabilidade.
Além disso, decisões recentes do STF e do TST, que afastaram a condenação em honorários aos litigantes-reclamantes e facilitaram a comprovação da gratuidade de justiça, agravaram ainda mais o problema, contribuindo para o aumento de práticas de litigância abusiva e predatória.
Nesse cenário de vários fatores negativos, as empresas precisam lidar com um cenário de aumento de litigância predatória e abusiva de modo inteligente.
A inteligência de dados surge como uma ferramenta indispensável para o enfrentamento estratégico dessas demandas, especialmente à luz da recente Recomendação nº 159 de 23 de outubro de 2024.
Essa recomendação propõe medidas concretas para a identificação, tratamento e prevenção da litigância abusiva, incentivando a adoção de práticas modernas que combinem análise de dados e estratégias preventivas.
Utilizando dessa perspectiva e de uma verificação profunda de padrões, litigantes “contumazes” e busca de causas-raiz, uma abordagem baseada em inteligência de dados não é apenas uma vantagem competitiva, mas uma necessidade operacional para empresas que desejam minimizar riscos e proteger sua sustentabilidade a longo prazo. É o único caminho para um contencioso trabalhista que vá além da contenção de danos, mas que se transforme em um meio de identificação de riscos, abusos e soluções.
As 4 Etapas da Inteligência de Dados no Contencioso Trabalhista
Aprofundamento da Análise da Carteira de Processos Trabalhistas: O primeiro passo é entender profundamente a evolução da carteira de processos da empresa, analisando aspectos como:
- Identificação do perfil dos escritórios que patrocinam um volume elevado de ações contra a empresa;
- Levantamento detalhado de valores pagos em acordos, execuções e depósitos judiciais;
- Apuração dos pedidos mais recorrentes formulados pelos reclamantes.
Essa análise permite identificar padrões como advogados que frequentemente litigam contra a empresa e demandas que se repetem em diferentes casos.
Dimensionamento da Carteira de Processos com Cálculos de Contingenciamento: Nesta etapa, é possível realizar o apontamento dos valores envolvidos nos processos trabalhistas, utilizando cálculos de contingenciamento baseados em classificação de riscos (possível, provável e remoto) e separação por tipos de pedidos, setores da empresa e gestores responsáveis.
Isso oferece uma visão clara do impacto financeiro das demandas e auxilia na priorização de ações.
Mais do que isso, essa fase permite à empresa verificar, de fato, qual a real dimensão dos processos e quão grande são os problemas judicializados.
Análise da Causa-Raiz das Condenações e Recomendações de Medidas Preventivas: Aqui, o foco é estudar detalhadamente os processos para identificar os fatores que levam a condenações.
Nesse ponto, a empresa detém a condição de verificar a raiz do problema. Se a questão é documental ou se envolve problemas gerenciais. Se o problema está em um procedimento ou em uma máquina.
Essa visão 360º a partir da análise dos casos e das origens do contencioso é fundamental para entender o que deve ser feito e o que deve ser obstado, com urgência.
A partir disso é possível a extração das medidas preventivas e corretivas recomendadas, como, por exemplo, a implementação de planos de ação baseados em jurimetria, estratégias para acordos que reduzam o passivo trabalhista, busca de medidas estratégicas diretamente no STF ou até mesmo a insistência estratégica de recursos para a estabilização de uma demanda no Tribunal Superior do Trabalho, que vem se propondo a ser um verdadeiro Tribunal de precedentes.
Mapeamento da Carteira de Processos Trabalhistas: O mapeamento completo da carteira, por fim, se devidamente dividido por fases processuais (conhecimento, recursal, execução e arquivado), é essencial para entender o panorama atual da empresa e identificar riscos potenciais, incluindo ações coletivas movidas por Sindicatos, muitas vezes apenas com intuitos financeiros e especulativos.
Nesse ponto, a inteligência de dados busca prever o futuro e antever riscos maiores e piores, como ações coletivas ou questionamentos administrativos em grande escala, pelo Ministério Público do Trabalho que, em último caso, podem verter em condenações milionárias ou até bilionárias se não bem tratadas na origem.
Nesse contexto, a identificação de padrões é o caminho não só para a mitigação de riscos, mas, se e quando bem estruturada, a identificação de padrões relevantes, como:
- Advogados que frequentemente litigam contra a empresa;
- Pedidos recorrentes em várias ações;
- Riscos de ações coletivas que podem representar um impacto substancial.
Com essas informações, é possível traçar estratégias preventivas e reduzir significativamente o número de demandas abusivas. Nesse contexto, a aplicação de ferramentas modernas de coibição da litigância abusiva, como as sugeridas pela Recomendação nº 159/2024, complementa a análise de dados ao proporcionar mecanismos jurídicos robustos para o enfrentamento dessas práticas.
A combinação entre inteligência de dados e ferramentas de coibição da litigância abusiva representa o futuro do gerenciamento do contencioso trabalhista que vai além da contenção. Com um “data-driven decisions” e “predictive analytics” bem estabelecidos, o gerenciamento estratégico trabalhista alcança um patamar diferenciado, no qual trabalham juntos os dados completos, os padrões racionalizados e as soluções jurídicas eficazes e sustentáveis.
A inteligência de dados é etapa essencial para a empresa que busca frear abusos e controlar seu passivo.
Empresas que buscam esse gerenciamento, adotam essas práticas de dados contratuais, judiciais e racionalizam essas informações em padrões certamente estão mais bem preparadas para enfrentar ações reiteradas e abusivas, combatê-las seriamente com as ferramentas trazidas pelo CNJ, preservando, assim, não só sua saúde financeira, mas sua imagem corporativa e a perenidade de seus negócios.
O futuro do direito empresarial está na convergência entre tecnologia, inovação e estratégia jurídica. O contencioso trabalhista estratégico também.
Autores:
Luiz Paulo Salomão
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Patrícia Maria Haddad
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