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6 de setembro de 2023

Aquisição de imóveis: alterações legislativas e boa-fé do adquirente

por CCHDC

A Lei 14.382/2022, de 27/06/2022, instituiu o SERP – Serviço Eletrônico de Registro Público, visando dar agilidade e celeridade às averbações e registros junto aos Cartórios de Registro de Imóveis, possibilitando que tais atos sejam requeridos pela parte de forma virtual, e não necessariamente na forma presencial.

Com isso, a Lei previu, em seu artigo 16, a alteração do artigo 54 da Lei 13.097/2015, definindo os documentos e certidões estritamente necessários à validade ou eficácia dos negócios jurídicos e para a caracterização da boa-fé dos terceiros adquirentes, autorizando os Cartórios ao registro da compra e venda.

Antes da entrada em vigência da referida Lei, havia a necessidade de obtenção de cerca de 20 Certidões relativas ao imóvel, comprador e vendedor para, além de garantir a segurança jurídica da operação, efetivar o registro junto ao Cartório de Registro de Imóveis.

Com o advento da Lei, tal procedimento foi profundamente alterado, sendo que, para que o Cartório proceda ao registro da compra e venda, a Lei exige os seguintes documentos (§2º, do artigo 54, da Lei 13097/2015, e artigo 1º, §2º, da Lei 7.333/1985) (i) Certidão de Matrícula do Imóvel; (ii) Certidão Negativa de Débitos Tributários; (iii) Certidão Negativa de Débitos Condominiais.

Assim, com a possibilidade de requerimento virtual de registros e averbações, bem como a exigência de quantidade reduzida de documentos, espera-se que a duração de tais procedimentos junto aos Cartórios seja de cerca de 02 (dois) dias.

Trata-se de diminuição considerável no prazo que era praticado pelos Cartórios, pois com o protocolo físico, além de toda a espera para efetivar o protocolo em si (muitas vezes de horas), também deveria se aguardar, em média, cerca de 30 (trinta) dias para a finalização da averbação/registro, ou nota de devolução com exigência(s).

Do ponto de vista prático, não há dúvidas que a Lei veio para facilitar todo o trâmite registral. Porém, embora não seja mais legalmente exigida toda a documentação anterior, a questão que remanesce é: até que ponto temos segurança jurídica nesse novo procedimento? Até que ponto, se seguirmos estritamente o quanto disposto na Legislação, o comprador poderá ser considerado adquirente de boa-fé?

Nos parece razoável afirmar que se o comprador cumprir com os requisitos da Lei 14.382/2022, poderá ser considerado adquirente de boa-fé. Porém, se, posteriormente, por qualquer motivo, houver a anulação da compra e venda, somente a boa-fé não lhe garantirá o direito à propriedade, mas sim o direito ao ressarcimento pelos danos sofridos.

Nesse ponto, importa destacar a questão da fraude à execução, pois se o comprador de um imóvel não se cercar das diligências e dos cuidados necessários – para verificação se o vendedor tem ações judiciais contra ele, em especial ação de execução – poderá ser surpreendido no futuro com eventual determinação judicial de desfazimento do negócio por fraude à execução ou, ainda, por fraude contra credores.

É certo que a Lei 13097/2015 é clara ao prever em seu artigo 54, alterado pela Lei 14.382/2022, que é de responsabilidade do credor averbar ou fazer constar na Matrícula dos devedores os ônus ou a existência processos judiciais e/ou penhoras, com o fito de criar presunção absoluta de fraude caso determinado bem seja vendido.

Essa disposição, vem ao encontro do que prevê a Súmula 375, do Superior Tribunal de Justiça, qual dispõe que “o reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.”.

Entretanto, embora, em tese, sejam dispensadas as demais certidões comumente obtidas para a operação de compra e venda de imóvel, entendemos que, por prudência, o comprador deve analisar não só a Matrícula, mas também as certidões judiciais, verificando a existência de ações judiciais e/ou dívidas em nome do vendedor que possam, eventualmente, reduzi-lo à insolvência.

Isso porque a proteção ao terceiro de boa-fé não afasta sua obrigação de ser diligente, agindo de forma zelosa, sendo este o comportamento esperado para o que o direito classifica como o “homem médio”. Ou seja, neste caso específico faz-se necessário cercar das cautelas que a operação requer, especialmente, em se tratando de bem de grade valia, em que, via de regra, o comprador pode estar depositando todas as suas economias.

Importante salientar, ainda, que as mudanças nas regras concernentes à documentação exigida para que o comprador seja considerado de boa-fé são recentíssimas. Assim, certamente haverá a interpretação de nossos tribunais quanto às alterações legislativas. Dessa forma, enquanto não tivermos de forma solidificada o entendimento jurisprudencial sobre o tema, como dito, é de bom alvitre que os compradores continuem, prudentemente, obtendo todas as certidões relativas ao vendedor, bem como que seja realizada pesquisa judicial sobre distribuição de ações propostas contra este.

Paralelamente, aos credores de proprietários de imóvel, é imperioso que sejam averbadas na matrícula dos imóveis os processos e penhoras contra seus devedores, para que seja caracterizada a presunção absoluta de fraude na hipótese de venda do imóvel.

Em síntese, a legislação veio para facilitar e desburocratizar o trâmite relativo à documentação exigida na compra e venda. Contudo, tanto para os credores quanto para os compradores, entendemos e orientamos no sentido de remanescer a obrigação de comportamento diligente e zeloso em prol do interesse de cada qual, visando obter a maior quantidade de informações, para, dessa forma, mitigar problemas futuros.

Autores:

Antonio Tomasillo
[email protected]

Thamyres Risso
[email protected]

Mauricio Dellova de Campos
[email protected]

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